segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Saudade do que vejo

É possível sentir saudade do que se vê? Sentir falta do que está tão perto? Saudade do presente? Parece coerente usar a palavra saudade para falar do passado. Mas sinto diferente. Existe sim uma saudade do presente, uma saudade do que vejo.

Você quer uma explicação? Ainda que me esforce muito, não serei tão claro. Nesse caso, você teria toda a razão para abandonar esse texto, cujo autor não se faz entender, violando as regras de uma boa comunicação.

Mas há realidades que não são compreendidas através de palavras, mas pela imediata identificação interior. Se você também sente saudade do que vê, saberá exatamente o que tento dizer.
Não se pode confundir essa saudade com a insatisfação. O insatisfeito deseja ter um dia o que não tem; o saudoso deseja ter sempre o que está tendo agora. A insatisfação é um querer ter. A saudade é um querer não perder.

Quem tem saudade do que vê tem alma fotográfica: registra aquele instante preciosamente fugaz, com a vontade de eternizá-lo. Quem tem saudade do que vê, já sente falta do sorriso da pessoa amada no momento mesmo em que o sorriso lhe está sendo ofertado. É  sentir falta do abraço enquanto ainda estão abraçados. É sentir uma estranha e gostosa falta do que ainda está acontecendo. É a antecipação de uma saudade futura. É ter a sofrida sensação de se estar no amanhã com saudade do hoje.

Ter saudade do que vê é querer que um gozo vivido agora não se acabe nunca.  É querer que uma mesma cena, cuja execução mal terminou, se repita todos os dias do mesmo jeito, preservados os mesmos cenários, os mesmos atores, as mesmas músicas, as mesmas falas, o mesmo roteiro.  

É um querer, querendo: que o sorriso pueril continue sorrindo, que o canto alegre siga cantando, que o amor doce prossiga amando. E é assim que sigo: sentindo saudade das boas coisas que vejo e vendo a saudade das boas coisas que sinto.



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