sábado, 4 de julho de 2015

"Quem Sou Eu?" Por Dietrich Bonhoeffer

Nesses tempos em que buscamos seguidamente auto-promoção, o self-marketing, desesperadamente preocupados em "sair bem na foto", exibindo um "eu" que, muitas vezes, nada tem a ver com quem somos, mentindo o tempo todo para nós mesmos,  vale a pena ler esse maravilhoso poema de Dietrich Bonhoeffer que apresento a seguir. 

Aqui, o teólogo-mártir alemão caminha pelos labirintos da sua alma, buscando a resposta sincera e íntima à pergunta essencial: "quem sou eu?".

Bonhoeffer foi muito mais que um teólogo de gabinete ou um pastor preocupado apenas com "almas". Ele decidiu levar o discipulado cristão até às últimas consequências, desafiando o poder nazista e denunciando a igreja ofial alemã que, por amor a Hitler, negou  a Cristo. Foi enforcado pelos nazistas aos 38 anos de idade.


Quem sou eu?*




Quem sou eu? Seguidamente me dizem
que saio da minha cela
tão sereno, alegre e firme
qual dono de um castelo.

Quem sou eu? Seguidamente me dizem
que da maneira como falo
aos guardas, tão livremente,
como amigo e com clareza
parece que esteja mandando.

Quem sou eu? Também me dizem
 que suporto os dias do infortúnio
impassível, sorridente e com orgulho
como alguém que se acostumou a vencer.
Sou mesmo o que os outros dizem de mim?
Ou apenas sou o que sei de mim mesmo?
Inquieto, saudoso, doente,
como um passarinho na gaiola,
sempre lutando por ar, como se me sufocassem,
faminto de cores, de flores, às vezes de pássaros.

Sedento de palavras boas, de proximidade humana, 
tremendo de ira a respeito da arbitrariedade
 e ofensa mesquinha,
nervoso na espera de grandes coisas,
em angústia impotente pela sorte de amigos distantes,
cansado e vazio até para orar, para pensar, para produzir,
desanimado e pronto para me despedir de tudo?

Quem sou eu? Este ou aquele?
Sou hoje este e amanhã um outro? Sou porventura tudo ao mesmo tempo?
Perante as pessoas um hipócrita?
E um covarde, miserável diante de mim mesmo?
Ou será que aquilo que ainda em mim perdura,
seja como um exército em derradeira fuga,
à vista da vitória já ganha?

Quem sou eu?
A própria pergunta nesta solidão
de mim parece pretender zombar.
Quem quer que sempre eu seja,
tu me conheces, ó meu Deus,
SOU TEU.

Dietrich Bonhoeffer (1906-1945)



*Extraído da biografia de Bonhoeffer escrita por Eric Metaxas: "Bonhoeffer: pastor, mártir, profeta e espião". Editora Mundo Cristão.

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